sexta-feira, 27 de junho de 2008

Mais um trabalho de Cecília Zylberstajn: "Co-dependência"



Quem não acha importante cuidar de uma pessoa querida que passe por apuros? Como seres humanos, temos muitas vezes a necessidade de ajudar ao outro. Queremos que ele pare de sofrer e melhore. Não medimos esforços para amparar quem amamos e proteger das coisas que lhes fazem mal. Mas qual é o limite? Até onde devemos ir? Quanto devemos fazer para ajudar o outro? A intensidade e o grau de envolvimento devem ter um limite. Uma pessoa que vive o problema do outro como se fosse seu e se preocupa mais em ajudar o outro do que em ajudar a si mesma é chamada de co-dependente.
O termo co-dependência surgiu no final da década de 70, simultaneamente em diversos centros nos EUA. Originalmente, era usado para designar pessoas que tinham suas vidas afetadas pelo envolvimento com alcoólatras, desenvolvendo com elas um padrão de relacionamento nocivo a ambos. Muito antes disso, entretanto, já era sabido que os familiares de alcoólatras desenvolviam com esta pessoa uma relação parecida com a que esta pessoa desenvolvia com o álcool. Os familiares dos alcoólatras, na década de 40, sentiram a necessidade de criar um grupo de 12 passos, paralelo ao AAA, para que pudessem trocar experiências e se recuperarem. Assim nasceu o
Al-Anon.
Nos anos seguintes, a definição foi expandida para a convivência com outros vícios, transtornos do impulso ou compulsões. Hoje se sabe que o relacionamento com pessoas perturbadas, carentes, doentes, deprimidas e dependentes pode gerar a co-dependência.Estes relacionamentos são caracterizados por se evitar discutir os problemas e expressar abertamente as emoções. A comunicação não é direta e clara, e criam-se expectativas irrealistas sobre o outro doente. Existe uma espécie de pacto de silencio para não se mudar em nada o equilíbrio da relação, mesmo que seja em direção ao crescimento.
Melody Beattie, em seu livro Co-dependência Nunca Mais*, define o co-dependente como “uma pessoa que tem deixado o comportamento de outra afetá-la e é obcecada em controlar o comportamento dessa outra pessoa”.
A co-dependência é uma doença crônica e progressiva. Uma pessoa co-dependente é “viciada” em se vincular a pessoas problemáticas. Geralmente quando sai de um relacionamento com uma pessoa perturbada, procura uma outra pessoa perturbada e repete os comportamentos co-dependentes. Estes comportamentos incluem um “ajudar” ao outro compulsivamente e uma obsessão em tomar conta do outro.
A pessoa co-dependente tem baixa auto-estima, valoriza-se pouco, e considera o outro de quem cuida mais importante que ela mesma. Sente muita culpa, o que faz com que se responsabilize pelos comportamentos da outra pessoa. Sente também muita raiva, mas não se permite expressar abertamente este sentimento. O co-dependente pode usar esta raiva para se auto-agredir, protegendo assim o outro, de quem realmente sente raiva, mas que não pode ferir de nenhuma maneira.
O tratamento da co-dependência não é fácil, mas é possível. O ideal é combinar a psicoterapia com os grupos de auto-ajuda de 12 passos.
Na psicoterapia, a pessoa co-dependente tem como desafios: aceitar suas limitações em ajudar aos outros e colocar-se como sua prioridade número um; desenvolver um projeto de vida próprio, com objetivos e metas realistas; aprender que ajudar o outro significa dar-lhe autonomia e responsabilidade para decidir que ajuda precisa, lidar com a culpa; perceber e expressar a raiva; e que só pode ajudar o outro quando a ajuda estiver dentro das suas possibilidades; e também comunicar seus desejos e necessidades de forma clara e aberta.
Existem hoje muitos tipos de gupos de auto ajuda, entre eles o
Al-Anon, para familiares e amigos de alcoólatras, o MADA (Mulheres que Amam Demais), para mulheres dependentes de relacionamentos, e finalmente o CoDA (Codependentes Anônimos), para co-dependentes em geral. Nestes grupos é possível partilhar experiências e buscar a recuperação ao lado de pessoas com sofrimentos semelhantes.
As pessoas co-dependentes sentem como se o outro fosse seu bote salva-vidas. Mas este bote está furado e afundando. Mudanças geram medo, mas também representam desafios. O grande desafio do co-depentende é libertar-se, aprender a nadar, e ir na direção que deseja. Se estiver forte, poderá até rebocar o bote salva-vidas e assim, de verdade, ajudá-lo.

* Melody Beattie. Co-dependência nunca mais. Ed Record, 1997.


Cecília Zylberstajn é Psicóloga Psicodramatista.(http://www.ceciliaz.com.br/)

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